A esquecível passagem de Maicosuel

Há três anos, o São Paulo anunciava a contratação do jogador, um dos muitos nos últimos anos a custar caro e jogar pouco.

--

A contratação de Maicosuel pelo São Paulo, há exatamente três anos, foi uma grande surpresa. Seu nome estava longe de ser o ideal para uma boa parte da torcida, afinal ele vinha de uma passagem bastante apagada pelo Atlético-MG. Naquela temporada de 2017, ele tinha entrado em campo apenas dezoito vezes, sendo somente seis como titular. Ao longo de três anos no clube mineiro (interrompidos por uma temporada emprestado ao Al Sharjah, dos Emirados Árabes), Maicosuel atuara 86 vezes, marcando nove gols.

O jogador, entretanto, apostava em uma virada: “A minha autocrítica é muito forte. Sei que não venho jogando o que posso. Dou meu melhor, [mas] às vezes as coisas não acontecem. Mas tenho de provar, principalmente para mim. Sei das pessoas que acreditam em mim. Se as coisas acontecerem naturalmente, dará tudo muito certo.” O então diretor de Futebol, Vinícius Pinotti, apresentou-o com elogios: “É um jogador de muita qualidade. Chega com a nossa confiança. Tem muita bagagem para contribuir nesse novo momento do São Paulo.”

Para ficar com Maicosuel — agora preferindo ser chamado de Maico, nome que usava nas costas, abaixo do número 7 — , o Tricolor despendeu um milhão de euros (cerca de 3,6 milhões de reais no câmbio do dia). Esse valor foi obtido em uma negociação com o Mirassol, que detinha um percentual dos direitos de Luiz Araújo e abriu mão de uma parte que equivalia a aproximadamente quatro milhões de reais. Segundo José Eduardo Martins, do Uol Esporte, o salário acertado era “considerado alto para os padrões do futebol brasileiro”.

Maicosuel foi apresentado e seguiu para seu primeiro treino com os novos companheiros. Fotos: Érico Leonan/São Paulo FC.

Sua chegada era anunciada como reposição para as perdas de Luiz Araújo, vendido ao Lille, da França, Neílton, negociado com o Vitória, e Chávez, cujo empréstimo ao Boca Juniors estava por vencer. Apesar de eu não ter encontrado esta informação em nenhum jornal ou portal na época, confirmei com um setorista do São Paulo que a contratação foi pedida por Rogério Ceni, após indicação do então centroavante do time, o argentino Lucas Pratto. “A ideia inicial com o provável reforço é aumentar a disputa interna por posições e ganhar novas opções táticas”, escreveram Marcelo Hazan e Rafael Araújo no Globo Esporte, ao analisarem a contratação.

Não por acaso, a diretoria apressou sua documentação, para ele ter condições de estrear já no dia seguinte à sua apresentação, contra o Vitória. Logo após ser apresentado, já participou de seu primeiro treino com o novo clube e não teve nenhuma restrição física.

Leia também:

Escalado como titular, pouco apareceu. Seu grande momento terminou com uma grande defesa do goleiro baiano. Ele acabou substituído no intervalo, por Thomaz, que abriria o placar — o São Paulo venceria por 2 a 0. Para o jogo seguinte, contra o Corinthians, no Itaquerão, Maicosuel foi cortado de última hora e encaminhado ao Reffis, com um desequilíbrio muscular.

Apesar de ter passado por exames médicos antes de ser contratado, os médicos são-paulinos não detectaram nenhum problema. Assim, ele foi afastado poucos dias após sua contratação. Ele não voltaria a jogar sob o comando do técnico Rogério Ceni, demitido menos de um mês depois. Em entrevista ao Globo Esporte em maio de 2020, ele diria que já tinha chegado contundido: “Eu cheguei no São Paulo já machucado, eles sabiam que eu estava machucado, e lá o [fisioterapeuta Ricardo] Sasaki e toda a fisioterapia me acolheram muito bem. Tentaram me recuperar o máximo possível, acho que foram três meses lutando muito contra a pubalgia, sempre treinando.”

O único gol de Maicosuel pelo São Paulo foi contra o Atlético-PR no Pacaembu. Fotos: Marcos Ribolli/Globo Esporte e Rubens Chiri/São Paulo FC.

Até o fim de 2017, Maicosuel faria apenas mais sete jogos com a camisa tricolor. Seu único gol veio na virada contra o Atlético Paranaense, no Pacaembu. “Achei que as coisas deslanchariam, mas aconteceu o contrário e não joguei mais”, diria, em 2020, na entrevista ao Globo Esporte. “São coisas que não dá pra entender.”

Sua única chance em 2018 foi no primeiro jogo do ano, contra o São Bento, em Sorocaba, uma partida em que o técnico Dorival Júnior poupou não apenas o time titular, como também vários reservas. A derrota por 2 a 0 mudou o planejamento de escalar poucos titulares e também marcaria, por coincidência ou não, a última partida de Maicosuel pelo Tricolor, apesar de ele ainda ter pela frente quase dois anos e meio de contrato. Segundo o Esporte Interativo apurou, havia problemas extracampo.

Em fevereiro, apenas oito meses após ser contratado, ele foi emprestado ao Grêmio. Inicialmente, o clube gaúcho pagaria metade do salário do jogador, mas, após fazer exames médicos e constatar o desequilíbrio muscular que os médicos são-paulinos não tinham encontrado e um problema crônico no púbis, ficou acertado que o São Paulo seria o responsável pelo pagamento integral dos salários nos primeiros seis meses. Somente se o empréstimo fosse renovado, após esse prazo, é que os salários passariam a ser uma responsabilidade 100% gremista.

A apresentação no Grêmio. Foto: Lucas Uebel/Grêmio.

Após quatro meses de empréstimo, o Grêmio decidiu não renová-lo. Foram doze jogos pelos gaúchos, incluindo a decisão da Recopa Sul-Americana, contra o Independiente, da Argentina, mas suas atuações não agradaram. Como Maicosuel não fazia parte dos planos de Diego Aguirre, técnico do São Paulo desde março, a diretoria procurou um novo clube para ele.

Um novo empréstimo acabaria sendo fechado com o Paraná Clube, time que revelara o jogador, em 2005. O treinador Rogério Micale recebeu a notícia com elogios e cautela: “Reforço, com certeza. Maicosuel é um jogador com rodagem, experiente. Vai trazer maturidade, mas vamos ver como ele vai chegar.”

Desta vez, o São Paulo ficaria responsável apenas por metade dos salários, mas na renovação do empréstimo, no início de 2019, passou a pagar o total registrado em carteira de trabalho, com o Paraná arcando apenas com os direitos de imagem. Esse empréstimo também acabou antes do tempo previsto. “Problemas extracampo, como atrasos em pagamentos de direitos de imagem, fizeram Maicosuel entrar em rota de colisão com o Paraná e o contrato foi rompido”, informou o Globo Esporte.

Maicosuel treina na Vila Capanema. Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo.

Foram doze jogos pelos paranistas, com dois gols marcados, sendo um em cobrança de pênalti, Além disso, o gerente de Futebol do clube, o ex-goleiro Marcos, teria sido xingado pelo jogador, algo que só revelaria após pedir demissão do cargo. “Ano passado eu não aprovei a sua conduta profissional e era contra a sua contratação esse ano”, explicou Marcos. “Com certeza ele sabia disso, nunca escondi a minha avaliação profissional com relação a ele.” Maicosuel teria sido até impedido de treinar com o time pelo presidente Leonardo Oliveira, de acordo com o empresário do atleta.

De volta ao São Paulo, ele nem sequer precisava treinar mais. Como também não encontrou um novo clube, apenas esperou o contrato terminar, enquanto seguia tendo direito a seus salários normalmente. Seu contrato venceu no último dia 31 de maio, sem quase nenhum alarde. Foram apenas nove jogos pelo Tricolor, nenhum completo, com um gol marcado (um gol muito importante, mas, ainda assim, apenas um gol). Se considerarmos que o clube investiu cerca de dez milhões de reais entre a contratação e salários, pode-se dizer que foi pago mais de um milhão de reais por cada vez que ele entrou em campo com a camisa são-paulina.

Ao fim desses três anos de contrato, fica a certeza de que Maicosuel não foi um caso único. Ao longo dos últimos anos, o São Paulo tem feito essa, digamos, engenharia por vezes demais: vender jovens promessas por um bom dinheiro, mas usar esse dinheiro para contratar veteranos que raramente ficavam até o fim de seus contratos. Diego Souza, Éverton Felipe, Jonathan Gómez, Tréllez, Calazans, Willian Farias, Raniel estão aí para não me deixar mentir.

“Vim para ganhar títulos”, disse Maicosuel ao chegar ao Morumbi. Não ganhou — ao menos não com o São Paulo, porque no Grêmio venceu a Recopa Sul-Americana e o Campeonato Gaúcho. Mas entrou na galeria das contratações são-paulinas dos últimos anos que custaram caro e saíram bem antes do fim de seus contratos, quase sempre jogando pouco. Essa lista é um dos motivos para o São Paulo estar na desesperadora situação financeira atual.

--

--

Autor de três livros sobre a história do São Paulo. Pai, filho, neto e bisneto de são-paulinos.