Rogério comemora o primeiro gol que marcou, em Araras. Foto: Gazeta Press

Quando Rogério Ceni assumiu o gol tricolor

Alexandre Giesbrecht
Jogos do São Paulo
4 min readDec 8, 2015

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Apesar de ter levado a seleção brasileira ao tetracampeonato apenas dois anos antes, Carlos Alberto Parreira não chegou nem perto de ter o mesmo sucesso no comando do São Paulo. Contratado em junho de 1996, menos de seis meses após o anúncio da aposentadoria compulsória de Telê Santana, o técnico durou apenas 21 jogos, com sete vitórias, seis empates e oito derrotas. Após cinco jogos sem vencer, em outubro, Parreira foi demitido, e o auxiliar Muricy Ramalho, que ficara no banco interinamente quando da doença de Telê, assumiu novamente.

Faltavam seis jogos para acabar a primeira fase do Campeonato Brasileiro, e Muricy quase conseguiu classificar o clube para as quartas de final. Se tivesse vencido o Paraná Clube, na última rodada, teria sido suficiente, mas o empate eliminou o Tricolor. Ainda assim, o desempenho de 77,8% nessas partidas fez com que a diretoria o efetivasse para 1997. A diretoria queria apostar na promoção de jogadores das categorias de base e na volta de jogadores emprestados que foram bem em outros clubes, casos de Pereira (Colo Colo, do Chile) e Rogério Pinheiro (Atlético Mineiro). “Estamos sem dinheiro e temos de nos adequar à realidade”, explicou o presidente Fernando Casal de Rey.

Outra mudança sem custo foi promovida, esta envolvendo o goleiro reserva Rogério. O contrato do titular Zetti venceria no início do ano, e ele optou por tentar definir sua situação o mais rápido possível, tanto é que nem viajou ao Chile para o amistoso contra o Colo Colo, em 3 de dezembro. Ainda naquela semana, o São Paulo anunciou que concederia ao goleiro o passe livre — na época, jogadores permaneciam vinculados a um clube, mesmo que estivessem sem contrato — , permitindo que ele negociasse com qualquer clube. E numa posição de vantagem, pois tinha acabado de ser convocado pelo técnico da seleção brasileira, Zagallo, para o último amistoso do ano, em 18 de dezembro. “Saio feliz e acredito que o São Paulo também ficou feliz durante o tempo em que joguei”, declarou Zetti, que na semana seguinte assinaria contrato com o Santos, que também contratou o então badalado técnico Wanderley Luxemburgo.

A decisão de liberar o goleiro levou em consideração a grande promessa que era Rogério, que tinha convencido os dirigentes com suas atuações em treinos e nas poucas partidas em que substituiu o titular. Até Zagallo já o tinha convocado por duas vezes no primeiro semestre de 1996, para o time que se preparava para disputar o torneio de futebol dos Jogos Olímpicos de Atlanta (Dida, do Cruzeiro, e Danrlei, do Grêmio, acabaram sendo os escolhidos para ir aos Estados Unidos). “São essas qualidades de Rogério que estão parecendo consolar os são-paulinos pela saída de Zetti”, escreveu Tuca Pereira de Queiroz, d’O Estado de S. Paulo.

Rogério disse ter ficado sabendo que seria o novo titular ao ser informado por um jornalista: “Eu não leio jornais desde que cheguei do Chile e não posso esconder que é uma das melhores notícias que recebo em minha vida.” O goleiro decidiu até abreviar suas férias para um semana, a fim de aproveitar o momento mais perto do Morumbi. “Eu cheguei até a pedir para ir embora”, confessou. “Mas os diretores do São Paulo nunca aceitaram conversar. No fim, acho que acabou valendo a pena.”

O colunista Roberto Benevides, do Estadão, decretou: “A contratação de Zetti é um bom negócio para todos. O Santos ganhou um grande reforço para o Campeonato Paulista, e o São Paulo finalmente abrirá a vaga para o promissor Rogério, que precisa jogar para não ficar eternamente na condição de promessa. Zetti e Rogério têm tudo para brilhar em 1997.”

Rogério em 1997. Foto: Gazeta Press

Zetti ganhou um título por seu novo clube logo de cara: o Torneio Rio–São Paulo, disputado entre o final de janeiro e o início de fevereiro. Poucos dias depois, Rogério não ganhou um título, mas comemorou seu primeiro gol marcado. Ele já tinha tentado contra o Fluminense, em janeiro, mas o goleiro Léo fez uma grande defesa. Como o São Paulo só tinha um especialista em cobranças de faltas (o meia Adriano, que estava na reserva), coube a Rogério assumir o posto de principal cobrador: “Na ausência de um especialista, como o Adriano, vou cobrar as faltas.”

O goleiro tentava afastar as comparações com o paraguaio Jose Luis Chilavert: “Ele faz gols de falta e pênalti para se promover. Eu quero apenas ajudar o São Paulo a vencer.” De fato, ajudou, já naquele 15 de fevereiro, em que marcou o primeiro gol da vitória por 2 a 0 sobre o União São João, em Araras. O admirado Muricy repetiu, então, uma previsão que já tinha feito dois meses antes. “Eu garanto que ele será o goleiro do Brasil na Copa [do Mundo] da França [em 1998]”, previu Muricy. “É um goleiro que se aprimora cada vez mais e tem a somar a seu grande futebol a categoria para cobrar faltas.”

Ele errou em sua previsão, mas acertou no motivo dela. O resto é uma história de quase duas décadas.

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Autor de três livros sobre a história do São Paulo. Pai, filho, neto e bisneto de são-paulinos.